sexta-feira, 23 de julho de 2010

Igreja alerta para riscos de violência por causa da crise e da desigualdade social

23.07.2010 - 08:09 Por António Marujo

Cáritas irá gerir fundo nacional para socorrer vítimas da crise com contribuições das diversas dioceses.
A Igreja pede um “pacto social” para ajudar a combater a crise no país (Foto: Manuel Roberto/arquivo)

D. Carlos Azevedo, presidente da Comissão Episcopal católica da pastoral social, alertou ontem para a possibilidade de o agravamento da crise poder gerar violência e revolta por parte dos mais sacrificados. "Perante a perda do emprego, a ausência de ter que comer, pode haver situações de violência, de revolta", afirmou o bispo auxiliar de Lisboa, no final da reunião do Conselho da Pastoral Social, que reúne as instituições católicas nesta área.

Num discurso duro sobre a situação do país, o bispo considerou necessária "uma contestação política organizada que questione estruturas financeiras, comerciais, culturais, políticas", de modo a permitir "um pacto social mais sustentado e justo".

Em conferência de imprensa após a reunião, Carlos Azevedo fez um apelo a que a actual situação seja ultrapassada com o empenhamento de todos: "A crise é tão grave que não poderemos superá-la uns contra os outros: empresários contra sindicatos, sindicatos contra patrões, Governo contra oposição, oposição contra Governo." Posições "rígidas" e "enfrentamento de grupos de interesses" só provocarão mais vítimas, avisou.

Para socorrer as vítimas da crise, saiu da reunião a ideia de unificar os diversos fundos de solidariedade das dioceses. A Cáritas Portuguesa, que irá coordenar o fundo, avançará, para já, com 30 mil euros, recolhidos na operação Dez milhões de estrelas, no Natal do ano passado. A ideia é "congregar esforços" de modo a "rentabilizar os bens disponíveis", explicou o seu presidente, Eugénio Fonseca. Dentro de "poucos dias" haverá um encontro entre diferentes responsáveis para decidir de que forma funcionará este novo fundo nacional.

Na sua intervenção inicial, Carlos Azevedo criticou ainda o que considerou ser o apelo "obsceno" que ainda é feito nalguma publicidade, "mesmo de alguns bancos".

Os responsáveis católicos fizeram uma avaliação positiva do rendimento social de inserção (RSI), uma "ajuda fundamental para muita gente", disse Carlos Azevedo. Não comentando directamente as alterações introduzidas há dias no RSI por acordo entre PS e CDS-PP, o bispo manifestou a ideia de que o "acompanhamento deve ser muito exigente". Mas, por outro lado, a fraude fiscal "é um dos pontos da grande desigualdade" que subsiste no país. "Grandes gestores, com os seus ordenados fabulosos, permitiram que fossem ladrões dos outros", sublinhou.

Carlos Azevedo disse ainda que os empresários têm a "obrigação moral de investir". E criticou a "democracia de carga corporativa e opaca", apelando ao movimento social cristão para que se preocupe em "repensar o significado político do seu compromisso", sem se ancorar "num impossível apoliticismo".

Público