terça-feira, 25 de maio de 2010

Creches e lares com aumento zero no ano da crise social

Sector social
Creches e lares com aumento zero no ano da crise social

por Luís Reis Ribeiro, Publicado em 25 de Maio de 2010

Comparticipações do Estado para lugares em creches, idosos e deficientes podiam cair, mas afinal devem ficar congeladas

O protocolo entre o Estado e as instituições particulares de solidariedade social (IPSS) diz que os apoios públicos por utente (por crianças em creches, por idosos em lares, por deficientes a receber apoio especial) são actualizados à taxa de inflação que vigorou no ano transacto. Se assim fosse, o Estado cortaria este ano nas comparticipações que anualmente dá às instituições por conta dos serviços sociais que prestam, isto porque a inflação de 2009 foi negativa (cerca de -1,8%). Mas não é o que deve acontecer. Tudo indica que será aberta uma excepção em 2010: muitos apoios serão congelados e outros até poderão ser actualizados acima da inflação.

É o que dizem os dirigentes das IPSS ouvidos pelo i, que dentro de dias deverão assinar com o Ministério da Solidariedade Social os termos do protocolo de cooperação para este ano. O ano é de crise social - mais desemprego, forte destruição de emprego, cortes nas prestações sociais -, por isso "não faz sentido cortar", defendem. Em 2009 (ver quadro), cada creche reconhecida como IPSS recebeu quase 240 euros por criança inscrita, um aumento de 2,6% em relação ao valor de 2008. Este ano, se o contrato fosse seguido à letra, haveria um corte de 1,8%.

Dentro de dias, as IPSS e o governo devem negociar o protocolo de 2010. O i perguntou ao Ministério do Trabalho como irá fazer com a questão das actualizações das ajudas, sem contudo ter tido resposta até ao fecho desta edição.

O padre Lino Maia, presidente da maior rede nacional de IPSS - a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS) -, explica que "deverá haver uma actualização mais reduzida, mas em alguns segmentos das nossas respostas terá de haver subidas maiores nas comparticipações. É o caso dos apoios aos idosos mais dependentes, uma das áreas mais deficitárias, que durante muitos anos foi prejudicada nas actualizações", explica.

Lino Maia, que lidera uma estrutura que representa quase 70% das IPSS do país, explica ainda que "esta conjuntura veio agravar as situações de pobreza e de dependência total, por isso não faz sentido trabalhar num corte da comparticipação". A CNIS agrega entidades que no seu conjunto prestam apoio a quase 30 mil crianças, 50 mil idosos e dão emprego fixo a 150 mil pessoas.

Manuel Lemos, presidente da União das Misericórdias Portuguesas, a segunda maior estrutura do sector social, também está a trabalhar "num cenário de congelamento das comparticipações, embora isso não implique menos transferências para as instituições".

O valor global das transferências ao abrigo dos protocolos de cooperação foi de 1,2 mil milhões de euros em 2009, mais 4% em termos anuais. E este ano "continuará a aumentar", acredita Manuel Lemos. "Tem de subir pelo simples facto de este ano haver mais gente à procurar de apoio. Isso, aliás, está previsto porque muitas das respostas do sector social estão contratualizadas", acrescenta.

João Dias, vogal da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental de Lisboa, reconhece que à luz do protocolo assinado com o Estado "poderá surgir uma situação de maior aperto nas comparticipações financeiras, mas há segmentos de acção onde isso não faz qualquer sentido". "Há valências, como a assistência a idosos, que ainda são deficitárias porque foram prejudicadas na sua valorização ao longo de anos", diz o professor.

Em Portugal há cerca de 4 mil IPSS activas, contribuindo para 4,3% do produto interno bruto. "Ao todo, as instituições dão apoio a 600 mil pessoas - idosos, crianças, pessoas com deficiência, pessoas doentes - e empregam 200 mil. 41% destas instituições estão directamente ligadas à Igreja Católica", explicou Lino Maia.

Para além do universo da CNIS, onde estão filiadas quase 2700 instituições de apoio social, existem ainda outras 380 instituições que integram a União das Misericórdias e cerca de 80 nas Mutualidades.
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