domingo, 14 de dezembro de 2008

Enfrentar a crise?

O plano de relançamento da economia europeia merece reflexões sectoriais. A saúde não é excepção.

Paulo Kuteev Moreira

O Plano Europeu de Recuperação da Economia (PERE) apresentado pela Comissão Europeia merece uma reflexão sectorial. Vejamos alguns aspectos gerais e de seguida lancemos a debate algumas formas de aplicação no sector da saúde em Portugal.

Na sequência do estimulo do PERE espera-se que o governo português apresente um pacote de medidas que respeite quatro princípios estratégicos: 1) oportuno no sentido de ser uma intervenção rápida para apoiar a actividade económica no período de baixa procura; 2) temporário de forma a evitar a deterioração do equilíbrio orçamental alcançado no controle do défice público e não colocar em causa a sustentabilidade que poderia ficar excessivamente dependente do aumento de impostos no Futuro; 3) orientado no sentido de focalizar a intervenção nos desafios económicos associados ao combate ao desemprego e redução do crédito às famílias e às empresas; 4) coordenado nas várias acções e intervenções sectoriais de forma a multiplicar os impactos positivos na sustentabilidade orçamental de longo-prazo.

Estes quatro princípios pretendem atingir outros tantos objectivos, a saber: a) estimular a procura e a confiança do consumidor; b) reduzir o custo social da quebra económica e impactos nos cidadãos mais vulneráveis na medida em que muitas famílias serão afectadas pela crise e as medidas deverão apoiá-los no período de desemprego e fomentar a reinserção no mercado de trabalho; c) fomentar vantagens competitivas na preparação da Europa para o período pós-crise em sintonia com as exigências de competitividade, crescimento económico e emprego fomentando, desde já, reformas estruturais que apoiem a inovação e construam a nova economia baseada na sociedade do conhecimento; d) apressar a adopção de medidas e processos de baixa utilização do carbono no contexto da criação dos chamados empregos de “colarinho-verde” e oportunidades associadas aos futuros mercados das energias alternativas e respectivos serviços e diversidade de carteiras de produtos.

Neste contexto, qual o contributo das políticas de saúde para enfrentar a crise? Algumas formas através das quais as políticas de saúde poderão contribuir para enfrentar a crise poderiam incluir o reforço imediato do apoio ao empreendedorismo das micro-empresas e das Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) dedicadas a serviços na comunidade nomeadamente, serviços de cuidados de enfermagem, fisioterapia, reabilitação multidisciplinar e apoio social ao domicílio e/ou em instituições da comunidade; o lançamento imediato de programas de larga escala de formação em competências de apoio a idosos para jovens desempregados licenciados em ciências da saúde; o lançamento de concursos para empresas portuguesas capazes de desenvolver tecnologias de poupança energética nas unidades de saúde; apoios a idosos de baixos rendimentos na aquisição de medicamentos para condições crónicas; apoio a programas integrados e diversificados de educação para a saúde em escolas, local de trabalho e na comunidade; apoio às industrias portuguesas fornecedoras do SNS nomeadamente à produção de fármacos e tecnologias de apoio social (vulgo “ajudas técnicas” sociais); fortes incentivos fiscais aos seguros de saúde entre outras que deixamos para uma próxima oportunidade.

Não sendo ainda claro que alterações de emergência sofrerá o nosso Orçamento de Estado, são claras as expectativas do PERE em termos de estratégias de acção. As potenciais medidas políticas podem implicar algumas alterações na despesa da saúde, impostos e estímulos orçamentais mas não colocar em causa o Pacto de Estabilidade. Devem ser temporárias e reversíveis de forma a facilitar o rápido regresso à disciplina orçamental promovida na zona euro.

A “deterioração” orçamental agora permitida deverá ser temporária, promover a protecção e criação do emprego na saúde e o apoio ao empreendedorismo das pessoas através do envolvimento dos parceiros sociais e locais na elaboração e implementação dos planos de acção.
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Paulo Kuteev Moreira, Doutor em Health Management pela University of Manchester
Diário Económico

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