quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Da Doutrina Social da Igreja

Da Encíclica Deus é Amor extraímos algumas passagens expressivas e suficientemente elucidativas da importância da acção humana no seio da Igreja assim como das instituições que se dedicam à prática da Caridade.
Fazemos tão só e para já uma transcrição de expressões significantes.
A importância das organizações de(da) Igreja é aqui reconhecida.
Esta magnífica Encíclica é muito mais do que um hino de Amor. É sobretudo um apelo à inspiração no Amor (Deus) nas acções que o Homem é chamado a concretizar.
Esta Encíclica vai ocupar muito mais pensamento traduzida para a escrita.
Por agora somente trnascrevemos o que de mais significativo representa enquanto inspiração para todos aqueles que estão de Alma e Coração nas organizações dedicadas à prática da Caridade Cristã.

Caso diverso são as organizações caritativas da Igreja, que constituem um seu opus proprium, um dever que lhe é congénito, no qual ela não se limita a colaborar colateralmente, mas actua como sujeito directamente responsável, realizando o que corresponde à sua natureza. A Igreja nunca poderá ser dispensada da prática da caridade enquanto actividade organizada dos crentes, como aliás nunca haverá uma situação onde não seja precisa a caridade de cada um dos indivíduos cristãos, porque o homem, além da justiça, tem e terá sempre necessidade do amor.

Nesta situação, nasceram e desenvolveram-se numerosas formas de colaboração entre as estruturas estatais e as eclesiais, que se revelaram frutuosas. As estruturas eclesiais, com a transparência da sua acção e a fidelidade ao dever de testemunhar o amor, poderão animar de maneira cristã também as estruturas civis, favorecendo uma recíproca coordenação que não deixará de potenciar a eficácia do serviço caritativo. [26] Neste contexto, formaram-se também muitas organizações com fins caritativos ou filantrópicos, que procuram, face aos problemas sociais e políticos existentes, alcançar soluções satisfatórias sob o aspecto humanitário. Um fenómeno importante do nosso tempo é a aparição e difusão de diversas formas de voluntariado, que se ocupam duma pluralidade de serviços. [27] Desejo aqui deixar uma palavra de particular apreço e gratidão a todos aqueles que participam, de diversas formas, nestas actividades. Tal empenho generalizado constitui, para os jovens, uma escola de vida que educa para a solidariedade e a disponibilidade a darem não simplesmente qualquer coisa, mas darem-se a si próprios. À anti-cultura da morte, que se exprime por exemplo na droga, contrapõe-se deste modo o amor que não procura o próprio interesse, mas que, precisamente na disponibilidade a « perder-se a si mesmo » pelo outro (cf. Lc 17, 33 e paralelos), se revela como cultura da vida.

Segundo o modelo oferecido pela parábola do bom Samaritano, a caridade cristã é, em primeiro lugar, simplesmente a resposta àquilo que, numa determinada situação, constitui a necessidade imediata: os famintos devem ser saciados, os nus vestidos, os doentes tratados para se curarem, os presos visitados, etc.

A competência profissional é uma primeira e fundamental necessidade, mas por si só não basta. É que se trata de seres humanos, e estes necessitam sempre de algo mais que um tratamento apenas tecnicamente correcto: têm necessidade de humanidade, precisam da atenção do coração. Todos os que trabalham nas instituições caritativas da Igreja devem distinguir-se pelo facto de que não se limitam a executar habilidosamente a acção conveniente naquele momento, mas dedicam-se ao outro com as atenções sugeridas pelo coração, de modo que ele sinta a sua riqueza de humanidade. Por isso, para tais agentes, além da preparação profissional, requer-se também e sobretudo a « formação do coração »: é preciso levá-los àquele encontro com Deus em Cristo que neles suscite o amor e abra o seu íntimo ao outro de tal modo que, para eles, o amor do próximo já não seja um mandamento por assim dizer imposto de fora, mas uma consequência resultante da sua fé que se torna operativa pelo amor (cf. Gal 5, 6).

O Código de Direito Canónico, nos cânones relativos ao ministério episcopal, não trata explicitamente da caridade como âmbito específico da actividade episcopal, falando apenas em geral do dever que tem o Bispo de coordenar as diversas obras de apostolado no respeito da índole própria de cada uma. [32] Recentemente, porém, o Directório para o ministério pastoral dos Bispos aprofundou, de forma mais concreta, o dever da caridade como tarefa intrínseca da Igreja inteira e do Bispo na sua diocese, [33] sublinhando que a prática da caridade é um acto da Igreja enquanto tal e que também ela, tal como o serviço da Palavra e dos Sacramentos, faz parte da essência da sua missão originária. [34]

No que diz respeito aos colaboradores que realizam, a nível prático, o trabalho caritativo na Igreja, foi dito já o essencial: eles não se devem inspirar nas ideologias do melhoramento do mundo, mas deixarem-se guiar pela fé que actua pelo amor (cf. Gal 5, 6). Por isso, devem ser pessoas movidas antes de mais nada pelo amor de Cristo, pessoas cujo coração Cristo conquistou com o seu amor, nele despertando o amor ao próximo. O critério inspirador da sua acção deveria ser a afirmação presente na II Carta aos Coríntios: « O amor de Cristo nos constrange » (5, 14). A consciência de que, n'Ele, o próprio Deus Se entregou por nós até à morte, deve induzir-nos a viver, não mais para nós mesmos, mas para Ele e, com Ele, para os outros. Quem ama Cristo, ama a Igreja e quer que esta seja cada vez mais expressão e instrumento do amor que d'Ele dimana. O colaborador de qualquer organização caritativa católica quer trabalhar com a Igreja, e consequentemente com o Bispo, para que o amor de Deus se espalhe no mundo. Com a sua participação na prática eclesial do amor, quer ser testemunha de Deus e de Cristo e, por isso mesmo, quer fazer bem aos homens gratuitamente.

A abertura interior à dimensão católica da Igreja não poderá deixar de predispor o colaborador a sintonizar-se com as outras organizações que estão ao serviço das várias formas de necessidade; mas isso deverá verificar-se no respeito do perfil específico do serviço requerido por Cristo aos seus discípulos. No seu hino à caridade (cf. 1 Cor 13), São Paulo ensina-nos que a caridade é sempre algo mais do que mera actividade: « Ainda que distribua todos os meus bens em esmolas e entregue o meu corpo a fim de ser queimado, se não tiver caridade, de nada me aproveita » (v. 3). Este hino deve ser a Magna Carta de todo o serviço eclesial; nele se encontram resumidas todas as reflexões que fiz sobre o amor, ao longo desta Carta Encíclica. A acção prática resulta insuficiente se não for palpável nela o amor pelo homem, um amor que se nutre do encontro com Cristo. A íntima participação pessoal nas necessidades e no sofrimento do outro torna-se assim um dar-se-lhe a mim mesmo: para que o dom não humilhe o outro, devo não apenas dar-lhe qualquer coisa minha, mas dar-me a mim mesmo, devo estar presente no dom como pessoa.

Quem se acha em condições de ajudar há-de reconhecer que, precisamente deste modo, é ajudado ele próprio também; não é mérito seu nem título de glória o facto de poder ajudar. Esta tarefa é graça. Quanto mais alguém trabalhar pelos outros, tanto melhor compreenderá e assumirá como própria esta palavra de Cristo: « Somos servos inúteis » (Lc 17, 10). Na realidade, ele reconhece que age, não em virtude de uma superioridade ou uma maior eficiência pessoal, mas porque o Senhor lhe concedeu este dom. Às vezes, a excessiva vastidão das necessidades e as limitações do próprio agir poderão expô-lo à tentação do desânimo. Mas é precisamente então que lhe serve de ajuda saber que, em última instância, ele não passa de um instrumento nas mãos do Senhor; libertar-se-á assim da presunção de dever realizar, pessoalmente e sozinho, o necessário melhoramento do mundo. Com humildade, fará o que lhe for possível realizar e, com humildade, confiará o resto ao Senhor. É Deus quem governa o mundo, não nós. Prestamos-Lhe apenas o nosso serviço por quanto podemos e até onde Ele nos dá a força. Mas, fazer tudo o que nos for possível e com a força de que dispomos, tal é o dever que mantém o servo bom de Cristo sempre em movimento: « O amor de Cristo nos constrange » (2 Cor 5, 14).

A fé, a esperança e a caridade caminham juntas. A esperança manifesta-se praticamente nas virtudes da paciência, que não esmorece no bem nem sequer diante de um aparente insucesso, e da humildade, que aceita o mistério de Deus e confia n'Ele mesmo na escuridão. A fé mostra-nos o Deus que entregou o seu Filho por nós e assim gera em nós a certeza vitoriosa de que isto é mesmo verdade: Deus é amor! Deste modo, ela transforma a nossa impaciência e as nossas dúvidas em esperança segura de que Deus tem o mundo nas suas mãos e que, não obstante todas as trevas, Ele vence, como revela de forma esplendorosa o Apocalipse, no final, com as suas imagens impressionantes. A fé, que toma consciência do amor de Deus revelado no coração trespassado de Jesus na cruz, suscita por sua vez o amor. Aquele amor divino é a luz — fundamentalmente, a única — que ilumina incessantemente um mundo às escuras e nos dá a coragem de viver e agir. O amor é possível, e nós somos capazes de o praticar porque criados à imagem de Deus. Viver o amor e, deste modo, fazer entrar a luz de Deus no mundo: tal é o convite que vos queria deixar com a presente Encíclica.

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